2007-23

Corta Luz / Pivô, 2013

Projetos em residência | Projects in residency Pivô, Copan SP

Bolsa | Grant Estímulo às Artes Visuais da Funarte / Prêmio Honra ao Mérito Arte e Patrimônio IPHAN

Agradecimentos | Special thanks Fernanda Brenner/Tyaga Sá Brito/Sandra Oksman/Marta Ramos-Yzquierdo/Jaime/Nenê/Paulo (Pivô) ; Ricardo Mendes (Copan) ; Bettina Federici (texto) ; Glauco Firpo (fotos).

Exposições individuais | Solo shows
Entre Lugares, CameraSete, Belo Horizonte, 29.04 - 09.07.2016
Corta Luz, Pivô Convida, 03.08 - 31.08.2013

Exposições coletivas | Group shows
Pavilhão Casa França Brasil, Rio de Janeiro, 09 - 30.07.2016
Fotografia Contemporânea Brasileira: Novos Talentos, Caixa Cultural Rio de Janeiro, 12.08 - 18.10.2015
Caixa Cultural Brasília, 24.11.2015 - 17.01.2016
Curador | Curator Vanda Klabin
Paysages Humains, MdM Gallery, Paris, 06.11.2014 - 10.01.2015
Espaços Deslocados - Futuros Suspensos, MAC Niterói, 07.09 - 30.11.2014
Edital Prêmio Honra ao Mérito Arte e Patrimônio IPHAN, Paço Imperial, Rio de Janeiro, 14.05 - 15.07.2014

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Série Corta Luz, 2013

Impressão com tinta de pigmento mineral em papel algodão | Printing with mineral pigment ink on cotton paper
Tamanhos variados | Varied sizes
Texto Marta Ramos-Yzquierdo
Folder (/Paloma Bosquê)
Making-of Pivô

Corta Luz, 2013
[Camera: Letícia Ramos / Audio: Carlos Guzmán]

(Trechos do texto Corta Luz | Excerpts from Corta Luz text)

Morei por um curto período em São Paulo e nunca entrei no Louvre, apenas o avistava da janela. Morei por um curto período em Paris e nunca entrei no Louvre, apenas o avistava da janela.

Conheci o Copan através de uma fotografia alemã. Todos estrangeiros, tentando falar alguma coisa sobre a arquitetura moderna brasileira, ou não. Morando ali eu não tinha a noção da imagem famosa do populoso complexo que reúne em 6 blocos 1610 apartamentos porque eu me havia tornado uma unidade autônoma contida na imensidão.

Vivi ali por mais tempo que o então dono daquela casa de veraneio invernal no centro novo da capital, que a vendeu logo em seguida da minha partida. Eu mal conhecia o Ricardo e não fazia ideia de quem eram Keila, Alice, Camila e sabe-se lá quem mais havia passado por ali. Pagava as contas que iam vencer e pronto.

Meu horizonte eram verticais de prédios; janelas que se multiplicavam sem cessar, já que umas se refletiam nas outras entre transparências e interpenetrações. Avistava um coração na vidraça vizinha. A leitura é a mesma para quem está dentro ou fora, uma maneira eficaz de comunicação entre milhares de pessoas que dividem a mesma quadra triangular. O coração no Louvre e eu no Copan.

Minha Copancabana inscrita no Guiness Book.

Expandia e contraía os caminhos a percorrer, protegida na metrópole da Companhia Panamericana, onde espaço público e privado se misturam harmonicamente. Do meu apartamento no bloco B ao escritório do Pivô, bastava pegar um elevador e subir uma escada. O ateliê era uma continuação orgânica da casa habitada, reproduzida em ambientes distintos mas em escala semelhante. Os pregos reapareciam nas paredes e o sofá-cama ficava à disposição dos visitantes.

Reconhecia o cheiro da casa e não me assustava mais com os barulhos perdidos, com a buzina de navio que era a descarga da vizinha ou com o baticum repetitivo de um apartamento próximo, nem com o porteiro empurrando as contas por debaixo da porta. Gostava até do sabonete em barra. Tive que me registrar na administração do edifício. Acho que até hoje tenho um cadastro de moradora para que, segundo o síndico, todos saibam que eu exista e que, assim, possam me proteger.

Cercada pelo Louvre, Investimento, Hotel Boulevard, Conjunto Zarvos, Ambassador, San Siro e São Luis Plaza, sentia o tiritar da chuva sobre a cobertura do cinema, no mesmo ponto onde via o fantasma do funcionário que me observava pelas manhãs. O vento que chacoalhava tudo, os plásticos que chiavam, as plantas que dançavam e algumas que tombavam. E quanto mais tempo admirava o arraial de quintais, mais vasos randômicos apareciam. Eram pequenos jardins improvisados, ilhas verdes no meio do cimento, que tentavam levar um pouco de vida para aquela seca selva de pedra atlântica.

Arquitetura para uma cidade nova, sem ruína. A mudança do olhar de quem trafega pelas ruas com o afã de mirar para cima para escapar dos prédios, não das montanhas. Penso em Nova Iorque no início do século XX e as imagens que vieram de lá, paisagens verticais, marcos da história da fotografia. Lembro do Copan de Andreas Gursky no início dos anos 2000 e em outras tantas fotos, não só do edifício retratado em demasia, mas de toda a urbanidade de São Paulo.

Na casa-obra do arquiteto, eu criei a minha. Obra e vida se misturaram em uma performance dilatada, que começava em casa e se alastrava pelo prédio em reflexões sobre um cotidiano aparentemente bastante conhecido. A obra como um todo não tem um fim em si mesma, é uma experiência recorrente que vai mudando de endereço de tanto em tanto, extraindo matéria de suas próprias dobras. Obra dobra.

Ao atravessar o bequinho do Investimento em direção à São Luis, enfrentando a ventania canalizada na rua de pedestres, olhava ao redor e imaginava o que um dia foi a Vila Normanda. Sentia o Copan pelas costas e imaginava o posto de gasolina. Carros, sempre carros. Em pleno domingo à tarde, grande parte das ruas desertas, com exceção dos carros que jamais deixarão de circular na cidademobil que sempre implora por estacionamentos e garagens automáticas. E quanto mais caminhava, mais percebia as transformações do lugar, seja pelas placas de vende-se, pelos imóveis (re)abandonados ou pelos anúncios dos novos empreendimentos na tentativa de uma outra ocupação residencial e comercial seletiva do centro. Perto dos puticlubs, a Primeira Igreja Presbiteriana Independente tinha apenas um fiel e uma banda que se escutava alto pelo lado de fora. A antiga boate Kilt virou um terreno baldio. A cimentada Praça Roosevelt virou o parque de diversão ilegal dos skatistas insistentes.

A República continua fragmentada entre a graça e o temor do heterogêneo, reunindo o melhor e o pior dos mundos, das diferenças e indiferenças sociais. A recentralização traz gente como eu para um centro de todos que pode vir a ser um centro só de alguns. O inóspito só existe para quem quer.

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Série Pivô, 2013

Impressão com tinta de pigmento mineral em papel algodão | Printing with mineral pigment ink on cotton paper
63 x 85cm
Ed. 3 + 2 P.A.

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